Um
anjinho nasceu em meio a um ambiente com inúmeras vulnerabilidades e como consequência
tinha complicações congênitas e doenças diversas causadas por má formação de
muitos sistemas de seu pequeno corpinho. Conheci o anjinho em um trabalho
extracurricular da faculdade, a mãe, sempre muito entusiasmada, dizia que ele
era um guerreiro e que conseguiria se recuperar daquilo que chamava de “pequenos
probleminhas”, pois havia nascido e ficado na UTI neonatal por um período e ele
havia conseguido sair, então outras questões seriam resolvidas. Aos quatro
meses de vida ele não conseguiu se recuperar de uma complicação e acabou
falecendo, o que foi difícil para a equipe e para a família, a mãe teve muita
dificuldade em aceitar a perda de alguém tão especial para ela.
Senti
uma profunda tristeza ao descobrir o que tinha acontecido alguns meses depois. Não
sei ao certo o que acontece para que alguns anjinhos voltem para o céu tão
rapidamente, mas eu resolvi nesse texto, homenagear alguém especial que, com
certeza, cumpriu sua missão na terra. Esta homenagem é uma reflexão para que
ele nunca seja esquecido e para que lembremos de fazer mais de nós por todos os
outros na mesma situação e que consigamos sempre não nos conformarmos com essas
situações, mas acalmar os nossos corações quanto a nossa impotência quanto
médicos e estudantes de Medicina.
Por
inúmeros motivos que ainda não entendemos lidamos com perdas de crianças muito
precocemente, seja por complicações de agravos de saúde, seja por má formações,
prognósticos ruins, canceres ou doenças terminais-degenerativas. Acaba alguns
desses momentos com um silencio entre os profissionais de saúde, um sentimento
de impotência por ter tentado todos os recursos e não ter obtido sucesso.
Escrevi
esse texto apenas para uma simples reflexão: a terminalidade da vida e o
processo de morte natural que ainda não aceitamos e compreendemos bem. Tanto
como pessoas da área médica ou externas, ainda sofremos e nos comovemos por
acreditar que somos imortais e que a Medicina obrigatoriamente deve ter a
resolução de todos os nossos problemas. Ela deve curar a sua ansiedade por meio
de remédios ansiolíticos, tornar pessoas mais jovens, por meio de procedimentos
de rejuvenescimento, exterminar do seu corpo um câncer, por meio de uma
quimioterapia que deve sempre ser milagrosa, melhorar sua enxaqueca tensional,
mesmo que o remédio traga mais efeitos colaterais que benéficos, resolver
milagrosamente com medicamentos ou procedimentos o seu ganho de peso exagerado.
Os
avanços da medicina são capazes de melhorar muito a vida dos doentes e curar
inúmeras doenças, mas, é inevitável dizer, que a Medicina é uma ciência praticada
por humanos, e como um reflexo disso apresenta falhas, erros e impotências. Com
isso, mesmo que os médicos, muitas vezes, sejam treinados para serem máquinas
de diagnósticos, tratamentos e encaminhamentos perdas acontecem. Então como
lidar com elas?
A
Medicina não terá sempre todas as respostas que você precisa e é necessário
saber que ela pode dar mais decepções que alegrias, mas você não pode deixar de
acreditar nela por isso. As perdas são inerentes do processo e do caminho, mas
não deixe que anjinhos e pessoas, suas histórias e suas vivencias sejam
esquecidas. Isso faz com que você se torne alguém melhor, que você altere os
caminhos e se empenhe mais para orientar e modificar fatores complicadores da
doença. Se empenhe, não desanime, por mais que as perdas sejam irreparáveis você
pode sempre aprender e ser melhor para agir de forma diferente das outras
vezes.
Não
importa o que tenha acontecido, anjinho é um guerreiro, lutou pela vida até
onde pode e permaneceu firme em meio as adversidades de inúmeras comorbidades,
sempre será lembrado por mim. Eu definitivamente estou em busca de respostas,
mas ainda não encontrei. Talvez lidar melhor seria acreditar que tudo existe
por um propósito maior e que não somos nós que vamos definir a hora que cada um
terá o fim de sua vida. Lute, mas não desista, no caminho poderão existir
anjinhos que voltam para o céu, mas que eles permaneçam sempre em nossa mente e
coração, nos motivando a sermos melhores, termos melhores condutas e
respeitarmos o fluxo natural da vida.
Janaina Silva
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